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       V

 

P R I S M A

 

 

 ...A MÃO no teclado prestes a desferir a nota primeira; o violeta do céu quando agoniza o dia; o rumor das rodas e dos êmbolos na usina; a fosforescência das águas povoadas de pólipos quando as fere o remo do pescador; a vil necessidade; o punho cerrado sedento de justiça; a sombra do galho à toa roçando na vidraça; a esverdeada maciez do musgo no canal onde garatujaram merda!; a sonoridade das palavras argamassadas com a pura substância das vogais; a charrete no portão da granja esperando a família feliz; o fantástico das neves penitentes no território dos sonhos; a surpresa de um abandonado coreto no recanto de uma cidade moderna; o desponível espreguiçar do vagabundo que dormiu sob a ponte; os pés que ficaram na areia e que a água desfará; o choro do recém-nascido pela madrugada na maternidade entre palmeiras; a inquieta descoberta da puberdade; o pensamento da morte, na imaginação dos tristes, ao acordar noite alta; o nome de Deus para explicar o mistério; e mais as grandes ilusões, e mais a inútil experiência - isto tudo que passa por você, que você despreza ou ama, tudo isto olha! é a vida: essa coisa desbordante, incoerente, maravilhosa, a vida!

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