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A Figueira de Tiradentes

   É uma figueira brava, de tronco carcomido e copa rala – uma árvore anciã. Quando jovem, era bela aquela árvore, à margem da estrada, rebrotada na primavera.

    A fazenda do Padre Corrêa – onde Pedro I gozava férias com a imperial família – encheu-se de casas, surgiram ruas, tornou-se um prolongamento da cidade de Petrópolis.

    Alargou-se o velho caminho de tropeiros para deixar passar o trem de ferro. Logo vieram os automóveis, que tomaram paralelamente mais terreno. E assim surgiu Corrêas.

    No meio da estrada, a figueira se destaca, sozinha e feia – sobrevivente de uma época que já vai longe.

    Ainda vive…

    Talvez não resista muito.

 

    Nos seus belos dias, quando bandos de pássaros cantavam pelos galhos, pousavam também à sombra da figueira a gente que descia das montanhas de Minas Gerais, pelo Caminho Novo, na Serra da Mantiqueira, em demanda da Corte. As águas do Piabanha regam as suas raízes. A figueira era um “alto” na estafante jornada.

    Entre os viandantes contava-se certo homem de mediana estatura, cabelos alourados, claro, de aspecto simpático. Era vivo, tinha o coração ardente, e sabia falar.

    Falava ao povo nas vilas, nas fazendas, por toda a parte. Afirmava estar para haver um levante, tanto em Vila Rica como no Rio de Janeiro e outras capitais do Brasil. Em Vila Rica, pessoas influentes, comandantes de tropa, desembargadores, padres, doutores, todos se haviam entendido. Bastava só esperar a cobrança dos impostos atrasados sobre o quinto do ouro – a derrama – para o grito de revolta.

    Era um movimento já vitorioso. O entusiasmo apoderava-se de todos os corações brasileiros, e podiam também contar com a França e a Inglaterra, que enviariam navios. Os generais-governadores, desalmados tiranetes, seriam despachados para Portugal, para nunca mais aqui mandar – e o Brasil seria uma nação livre, próspera, feliz.

    “Liberdade! Liberdade ainda que tarde!”

 

    O homem que assim falava não era outro senão o alferes do Regimento de Dragões da Cavalaria Paga da Capitania de Minas Gerais; Joaquim José da Silva Xavier, o Tiradentes.

    Ora uma vez, depois de vários dias de jornada, o Tiradentes alcançou o pouso da figueira.

    A noite vinha chegando.

    Arriou o seu bacamarte de cano de trombeta, junto à árvore e, acomodando a mochila, deitou o corpo cansado, adormecendo logo.

    Adormeceu e sonhou.

    Numa noite escura, num campo infinito, legiões de soldados lutavam bravamente. Grandes golpes eram desferidos, arcabuzes estouravam, animais cruzavam em disparada, havia sangue por toda a parte.

    A vitória parecia inclinar-se para o inimigo.

    Estavam prestes a vencer, quando um guerreiro desceu das montanhas, empunhando uma bandeira. Na bandeira viam-se entrelaçados três triangulos. E logo a seguir do guerreiro, que empunhava a bandeira bem alto, legião de soldados, gritando: “Viva a Liberdade!  Viva a Liberdade!”

    Então fêz-se tal desordem, os inimigos debandavam, precipitavam-se no mar, em desespero. Do mar levantava-se o Sol que iluminava serras e planícies, coisas e homens, num resplendor triunfal…

    Assim sonhou o protomártir sob a figueira, sonho cuja realidade não seria para os seus olhos…

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 07/09

IDADE HERÓICA

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