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      XXV

 

S U R D I N A

 

 

 VÃO-SE, um após outro, os dias - e tu olhas, às vezes indiferente, às vezes inquieto.  

     Vão-se, um após outro, e nenhum gesto teu pode deter o perpétuo, o célere escoar dos dias breves.

      (Espreita as outras faces e indagas. Mas as outras faces passam, distraídas ou absortas, e não te confidenciam o seu segredo - talvez porque não o tenham, talvez porque seja incomunicável).

      Com os dias, é a tua vida mesma que se vai, a tua vida que caminha para o chão do esquecimento.

     Então, exaltado pelo sentimento de tantas horas já perdidas, despertas numa alegria selvagem, e patético te dizes: "Vivamos, oh, vivamos esta hora!"

     E vives essa hora.

      Mas logo teu sôfrego coração, voluptuoso de mais, de algo mais - impossível - afunda no tédio das horas vazias, entre o desejo e o gozo.

     E de novo te aquietas, devorado pelo surdo desespero, enquanto as águas fluem dentro e fora, num ritmo igual.

     Só os olhos protestam - por que ainda protestam os olhos?

 

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