Xavier Placer
XXVII
ANTE O PEQUENO-GRANDE
...VOU PELA RUA, quando ouço a Tua voz. Me aproximo do acontecimento. NASCEU UM MENINO.
Não é fácil abrir caminho até junto do Teu berço. Além da nossa urgência, tumulto e circunstância tramam, Pequeno-Grande, para Te ocultar.
Necessário arredar tanto obstáculo, que tantos desistem. Ou aceitamos uma Tua prévia imagem – de bolso. Quando há que descobrir-Te – POIS NASCES PARA CADA UM.
Há que arredar muita falsa moeda. Mitologia muita. A par de trezentas toneladas de egotismo...
Delicadamente, Teu nascer vem refrescar-nos a memória. Mas fácil olvidamos. E prosseguimos entre arranha-céus, artefatos de guerra, ogivas nucleares, nosso ódio e nosso auto, dentro a vocação para o desamor.
2
COMO OLVIDAMOS fácil teimamos forte. De fato devemos fechar mil negócios, sepultar nossos mortos, ler jornais. Carecemos um dia de quarenta e oito horas e o encompridamos com drogas e buate.
Prisioneiros da hora e seus prestígios, cultivamos as verrugas da respeitabilidade. Somos técnicos e brilhantes. Adoramos o êxito, enquanto ensurdecemos para as presenças decisivas: um voo de pássaro, um cair de folha, uma palavra absoluta, o sulco em nós de um movimento do coração...
Neste dia raspamos a crosta, lavamos a escória, e do fundo desentranhamos (a nossa) a genuína imagem – Te vejo! Rosado e nuinho, Pequeno-Grande.
Nos braços de Tua mãe, junto a Teu pai, uns amigos, dois ou três bichos de casa e o fogo – tão simples, digo, tão solene. NASCEU UM MENINO. Não é o amanhecer?
3
NÃO TRAGO ouro, não trago oferendas. De mãos vazias. Abandono-te o meu espanto e a minha ignorante sageza. Em murmúrio quase silêncio – é o que possuo.
E me curvo diante da Tua fragilidade, fragilidade de forte. Onde tropeçamos todos: os que Te buscam e os que Te ignoram, os lógicos e os visionários – homens efêmeros.
Chegaste. Nasces, e paradoxalmente eu é que recebo. Nem são poucos os dons. É a Alegria, é o Amor.
– Sê bem-vindo, Pequeno-Grande !
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